OS CZARES RUSSOS (GLI ZAR RUSSI)
DE RURIK A ROMANOV (I)
Julio Pujol
Para
um historiador de formação marxista, saber a história e a cronologia dos
governantes (príncipes e czares) pouco ou nada ajudaria na compreensão do
processo histórico do imenso país, a Rússia.
Por outro
lado, para um leigo (quanto à metodologia histórica) talvez explicasse tudo.
Ele se sentiria um conhecedor seguro da história ao saber os nomes , as datas e
as particularidades de personalidade (afinal Pedro I era um visionário ou um
rústico bruto? Ivan IV era mesmo terrível? Quantos amantes teve Catarina?)
O papel do
indivíduo na história é um debate antigo entre os historiadores,
particularmente os marxistas. Esse enfrentamento teórico produziu incontáveis
textos, livros e teses publicadas por décadas. (Não é propósito aqui seguir
adiante).
Resumindo,
para o marxismo dialético, o motor da história (que a faz avançar) é a Luta de
Classes. E a mesma história evolui segundo os referenciais econômicos, mais
precisamente aos “Modos de Produção”, comunismo primitivo, escravismo,
feudalismo, capitalismo e por fim, as sociedades inexoravelmente chegariam ao
comunismo passando, claro, pela etapa do socialismo.
Como se vê,
não há aqui nenhuma referência ao indivíduo; a história andaria por si, por
suas próprias leis (científicas). O nó do debate era o seguinte: como explicar
então, por exemplo, o papel de Lênin e Napoleão na história?
Confesso que
me diverti muito nos anos de Faculdade de História (década de 90) com esse
debate. Para mim e para meus colegas era fundamental compreender essas
questões, debatê-las e ter uma posição sobre elas. Depois, com a “queda do
muro” e o fim da União Soviética tudo mudou. E eu também mudei. A Rússia teve
papel fundamental no século vinte, com sua experiência concreta de socialismo,
para alimentar, e quiçá, elucidar este debate teórico.
Voltando aos
czares russos, é importante sabê-los para compreender também a história deste
imenso país que teve ao longo dos séculos um papel determinante na história e
na configuração geopolítica do continente europeu e mesmo do mundo.
É preciso
lembrar que a Rússia por si só é um continente; é o maior país do mundo e
qualquer movimento seu, ou mesmo a sua inércia, tem um impacto planetário. Tem
sido assim nos últimos mil anos. Basta lembrar, por exemplo, a conversão dos
russos ao cristianismo bizantino (que depois propiciou a Moscou reivindicar o
papel de terceira Roma). E mais recentemente, no século XIX, a invasão
napoleônica. A derrota de Napoleão, de fato, se deu na Rússia, assim como a derrota
de Hitler, no século XX, deu-se também na sua aventura russa.
Por fim, a
Revolução Socialista de 1917 condicionou a história do planeta no século XX.
Basta lembrar, por exemplo, que em 1922 (apenas cinco anos após a Revolução
Russa) se criou no Brasil o Partido Comunista, e até hoje o debate Socialismo X
Capitalismo, Estado X Mercado, monopoliza as discussões políticas no país.
Mas voltando
novamente aos czares, a Rússia desde seu nascimento teve duas grandes
dinastias, os Rijurikovich e os Romanov.
A história do
Estado russo inicia quando os moradores da cidade de Novgorod chamam o príncipe
Riurik, de uma tribo do Báltico, para governa-los. Logo o poder de Riurik se
estende a Kiev (hoje capital da Ucrânia) garantindo a rota fluvial e comercial
do Dniepr que unia os povos do Báltico (Vikings) ao Mar Negro e a Bisâncio,
então um grande centro cultural e comercial que aproximava a Ásia da Europa.
Bisâncio foi a herdeira das grandes culturas grega e romana da antiguidade.
Assim nasce a chamada “Rus de Kiev”.
A partir daí,
ao longo dos séculos, e sob a condução dos descendentes de Riurik a Rússia se
expandiu, principalmente para o leste. Venceu seus inimigos, expulsou invasores
(germanos, polacos, suecos, turcos, mongóis, entre outros) e criou novas
cidades.
Em busca da
segurança do reino (dos principados) a Rússia vai mudando seu eixo de
centralidade. Kiev estava muito exposta a invasores e aventureiros. Então o
príncipe Vladimir II transfere a capital para uma região mais ao leste, próximo
ao rio Moscou e a rota comercial do rio Volga.
Em 1230 o
país é invadido e ocupado pelos mongóis (chamados tártaros). Essa ocupação
durou mais de duzentos anos e atrasou o desenvolvimento da Rússia. Ao mesmo
tempo os principados russos foram se fortalecendo e se unindo em torno do
principado de Moscou.
Ivan III
assume em 1462 (dando início a primeira dinastia de czares, os Rurikovich) e
teve um papel determinante na consolidação da unidade russa, seja por alianças
com outros principados, seja por conquista, seja por resistência ao domínio
tártaro. É chamado “Gran Príncipe de Moscou e de toda a Rússia” pela primeira
vez. É considerado, portanto, o primeiro czar de uma Rússia grande, forte e
unificada.
Na
continuidade deste texto analisaremos a trajetória de alguns dos mais importantes
czares da Rússia (príncipe Vladimir, príncipe Alexandre Névski, Ivan III, Ivan
IV, Pedro I, Isabel, Catarina II, Nicoulau, entre outros), e o papel
desempenhado por eles na configuração histórico, político, cultural e social
deste imenso país.