IVAN TURGUENEV (1818 –
1883)
Julio Pujol
Agrada-me ler Turguenev. Isso é quase
uma confissão. Turguenev é fácil. É leve. Lê-lo é como beber um bom copo de
água fresca.
Turguenev é
simples. Diferente dos gigantes da literatura russa do século XIX como Tchecov,
Dostoiévski e Tolstói, Turguenev não é complexo, profundo, filosófico. Também
não é superficial. Penso que está aí o seu mérito. Atingir o simples, e fazê-lo
bem, também não é tarefa fácil.
É como se
ele escrevesse para as mocinhas apaixonadas do século XIX, para os salões
europeus. Alias, seus escritos parecem não querer tocar no turbilhão
transformador da Rússia e da Europa deste século. Um século, diria, de
transição, do urbanismo e do capitalismo.
Mas, claro, Turguenev
também observa, tem as suas sutilezas. É um homem do tempo. É mundano, moderno,
senão seus escritos não teriam atravessado mais de um século, sendo lidos ainda
hoje, e sendo colocados como grandes obras da humanidade.
Nascido russo, em
Orel, 1818, em uma família de posses, pôde estudar e ter uma vida com certo
conforto numa Rússia ainda envolta na servidão (abolida somente em 1861), no
analfabetismo e no provincianismo.
Logo que pôde foi para
a Europa onde se estabeleceu, e de lá olhava seu país natal com um misto de
admiração, nostalgia e desprezo.
Na Alemanha, em
Berlim, conviveu com o que de mais avançado havia em seu tempo, seja na
literatura quanto na filosofia (particularmente Hegel), e em Baden Baden,
conviveu com a “árvore russa”, quer dizer, russos emigrados ou somente em
férias, que passavam temporadas neste país. Os russos sempre olharam para a
Europa, seja como referência e modelo, seja com superioridade (aquela
indiferença típica russa). Isso lhe permitiu manter proximidade com a Pátria
nativa.
Contemporâneo dos
grandes da literatura russa tinha uma relação também ambígua com eles. De
formação europeia, desenraizada da velha Rússia, Turguenev via o seu país de
fora; seu espírito crítico e desanimado não era muito simpático na Rússia que
buscava afirmar-se como uma grande Nação.
A força da Rússia
estava em Tolstói, sua raiz em Puchkin, sua alma em Dostoiévski e Tchecov, sua
ironia em Gogol... Mas Turguenev existia. E fez a sua grandeza por outra
estrada. Não a estrada dos grandes épicos, do patriotismo exacerbado ou do
eslavismo. Os escritos de Tolstói, Tchecov, Puchkin, Dostoiévski, Gogol são
universais mesmo partindo da “aldeia” (aliás, aquela frase é de Tolstói); os de
Turguenev são cosmopolitas, e olham a Rússia como quem espia para onde vai esse
imenso país.
Bom reler Turguenev.
Também para mim é como espiar para um jovem (jovial) que também espiava,
curioso, de longe, um futuro.
Turguenev corre pelo
meu orgânico. Faz parte de minha constituição enquanto ser. Foi emocionante, lá
em Petersburgo, dobrar uma esquina e, de surpresa, encontrar uma grandiosa
estátua do Conde Turguenev. (lá na Rússia os escritores e poetas tem estátuas e
monumentos pelas ruas e praças. E o povo não os depreda; pelo contrário, coloca
flores aos seus pés em reconhecimento. É uma coisa de identidade pátria. E
Turguenev está lá).
Algumas obras de
Turguenev facilmente encontráveis em livrarias no Brasil: “Pais e Filhos”, “Primeiro
Amor”, “Ninho de Fidalgos”, “Águas de Primavera”, “Fumaça”, “Mumu”.