HERMITAGE: um museu às margens do rio.
(Julio Pujol)
Em recente artigo neste blog escrevi
sobre a Galeria Tretiakov, de Moscou, dedicada a reunir e conservar obras de
arte tipicamente russas. Andar pelas suas salas é fazer uma viagem pela
história e cultura daquele imenso país.
A Tretiakov cumpre o seu papel também
porque reúne uma rica mostra do que os russos produziram de belo para o mundo.
Ali se vê claramente o quanto uma cultura local, nacional, pode ser universal;
o quanto o belo com suas diversas nuances é universal.
No Museu Hermitage, de São
Petersburgo, têm-se de certa forma o oposto: seus criadores (os czares Pedro I,
Isabel Petrovna, Catarina II, Nicolau, etc.) trouxeram o belo universal, de
diversas culturas e tempos para dentro da Rússia.
O museu, um dos maiores e mais ricos
do mundo, com suas mais de trezentas salas e com quase três milhões de peças,
permite-nos apreciar um panorama da arte mundial (também um pouco daquela
russa). Permite-nos viajar no tempo e no espaço.
Nele as obras de arte fundem-se com a
beleza, suntuosidade e elegância (às vezes clássica, às vezes barroca e rococó)
de suas salas e salões. Escadarias, mobiliário, decoração, arquitetura,
mármores, jardins, o dourado das grandes portas, a luz que penetra pelas
janelas e abre a visão do Neva, tudo é de uma beleza estupenda. Rio e museu
também se fundem; um sonho.
Criado inicialmente, por Pedro, o
grande, para ser a residência dos czares, na nova capital do Império Russo, e
depois reconstruído por Isabel Petrovna o Palácio de Inverno (projetado pelo
arquiteto italiano Rastrelli, em estilo Barroco) é o embrião do futuro Museu
Hermitage.
Hoje o complexo do museu compõe-se do
Palácio de Inverno, do Pequeno Hermitage (criado por Catarina II), do Velho (ou
Grande) Hermitage, do Novo Hermitage e do Teatro do Hermitage.
O Hermitage ao longo da história resistiu
a eventos muito difíceis: enchentes do Neva, incêndio, à Revolução de 1917, ao
Stalinismo e mais recentemente ao cerco dos nazistas. Na Segunda Guerra os
alemães cercaram São Petersburgo por novecentos dias. A ideia era conquistar a
cidade pelos bombardeios, pela fome e pelo frio. Mais de três milhões de
peterburguenses foram mortos.
As obras do Hermitage foram evacuadas
para Ekaterimburgo, além dos Urais, na Sibéria, onde a guerra não chegou.
Durante o cerco, apesar da fome e das bombas, as visitas ao Museu continuaram.
Os guias mostravam as paredes vazias e apresentavam os quadros como se ainda
estivessem lá. Era uma forma da arte também resistir à barbárie. O Museu carrega
a mística de São Petersburgo, uma cidade que resiste.
São Petersburgo foi uma cidade planejada e construída
em 1703 para ser a capital do Império, às margens do rio Neva, que desemboca no
mar Báltico, e dali liga a Rússia a toda Europa. Pedro I primeiro pensou São Petersburgo como
uma porta (ou janela) para a Europa.
As Obras
De fato o Hermitage nasce da vontade
e decisão da czarina Catarina II que manda construir, ao lado do Palácio de
Inverno, um “Eremitério”, ou espaço para contemplação e reflexão, onde ela
poderia expor e apreciar suas obras de arte. Eventualmente Catarina convidava
seus próximos a visitarem seu “Eremitério”. O silêncio e a formalidade eram a
regra. Aos poucos o espaço foi sendo aberto à visitação de estudantes de arte.
Dia 7 de dezembro (dia de Santa Catarina) é considerada a data de aniversário
do Museu.
Das primeiras aquisições de Catarina,
principalmente na Europa, nasce o acervo do Museu. Como não era uma
especialista em arte, buscou ajuda de conhecedores, entre eles Diderot e Grimm.
Em 1796 quando falece Catarina I o Hermitage já contava com quatro mil obras.
Em 1805 torna-se um museu público, embora ainda Imperial.
Seu acervo só cresceu, embora em alguns
períodos algumas obras foram vendidas e, depois da Revolução, o Hermitage
abasteceu vários museus do interior da Rússia.
Difícil enumerar ou falar hoje das
importantes obras que existem lá. Como falei antes, são quase três milhões.
Claro, nem todas são quadros. Estão lá objetos arqueológicos dos Citas,
primeiros povos a ocuparem o território russo, dos gregos, dos egípcios, dos
africanos. Prataria francesa, cerâmica inglesa e italiana, mobiliário e
vestimentas dos czares russos, bustos romanos, arte chinesa, e tanto mais.
Mas o que torna o Hermitage uma
referência e um dos principais museus do mundo sem dúvida é a coleção de
pinturas. E esculturas. Ali se pode ver um panorama da arte europeia do século
XV ao século XX. Há preciosidades como obras de Michelangelo, Rafael, Leonardo
da Vinci e de vários do Renascimento Italiano.
O museu possui uma das maiores (ou a
maior) coleções da Arte Holandesa e Flamenga do período Barroco do mundo. Um
grande acervo do classicismo e do expressionismo francês. Obras do retratismo
inglês e uma grande coleção também dos espanhóis do século XVI.
Não dá para citar todos, mas para
termos noção da grandeza do Hermitage podemos falar de quadros dos italianos
Ticiano, Tintoreto, Veronese; “O Tocador de Alaúde” de Caravaggio, “Judite” de
Giorgione... Depois tem os espanhóis, holandeses, alemães, ingleses, franceses.
“São Pedro e São Paulo” de El Greco; “Perseu e Andrômeda” de Rubens. Muitos
Rembrandt como “A Volta do Filho Pródigo”, Hubert Robert (a maior coleção do
mundo).
Tem Francisco de Goya, Monet,
Rrenoir, Van Gogh. Sim, tem Van Gogh. Um grande acervo, luminoso, de Gauguin.
Tem Cézanne, Picasso, Kandinsky e Matisse. E vou parando por aqui para alguns
breves comentários pessoais.
Estive apenas uma vez no Hermitage.
. Uns dois dias e sei que precisava muito mais. Na realidade o Hermitage é infinito se a cada vez também nosso olhar é novo. Vale uma viagem a São Petersburgo. O problema é que também a cidade é uma obra de arte e demanda muitos dias e muitos olhares. Escreverei.
. Uns dois dias e sei que precisava muito mais. Na realidade o Hermitage é infinito se a cada vez também nosso olhar é novo. Vale uma viagem a São Petersburgo. O problema é que também a cidade é uma obra de arte e demanda muitos dias e muitos olhares. Escreverei.
Para mim, de apaixonar, no Hermitage
e cito apenas algumas impressões e sensações está em primeiro lugar (para um
professor de história) poder subir as escadarias do Palácio de Inverno por onde
os Revolucionários de Lênin subiram naquele outubro de 1917 e mudaram a
história da humanidade no século XX. E onde também Eisenstein filmou o seu
famoso filme “Outubro”, para comemorar os dez anos daquela Revolução.
As esculturas de Rodin, Falconet e
Canova são indizíveis. Só o silêncio pode explica-las. Na linguagem popular: “só
vendo”. E é isso: só vendo. “As Três Graças” de Canova é absolutamente
espiritual, porque é possível arrancar o espiritual da pedra. E Canova
conseguiu. É Sublime. Só essa peça vale uma viagem à Rússia.
Mexeu comigo estar diante de “A Dança”
e de “A Música” de Matisse. Dois imensos quadros de 2,60m por 3,90m.
Impactante. Não sabia que estavam lá, e quando entro em uma sala eles se
apresentam enormes. Se pode dançar junto. E estar diante de um Van Gogh também
te tira as palavras. As cores de Paul Gauguin me seduziram. Na realidade cada
sala te acolhe como se ela fosse a mais exuberante. Até você passar para a
próxima.
Bem, não se pode escrever tudo, então
vou parando.
Pra encerrar, três referências que me
ajudaram neste texto:
O álbum-roteiro “Ermitage” da Ed. P-2
de São Petersburgo, 2006;
e “Museu Hermitage” – Coleção Folha –
Grandes Museus do Mundo – 16, 2009 da Ed. Mediafashion. RJ.
O filme “Arca Russa” de Alexander
Sokurov, 2002, filmado todo dentro do Museu em uma tomada só, que mostra o
quanto está ali um pouco, ou muito, da alma Russa.
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