domingo, 8 de maio de 2016

O DIA DA VITÓRIA NA RÚSSIA















No dia 09 de maio os russos comemoram o Dia da Vitória na Segunda Guerra Mundial. É a data mais importante do país. 

A Rússia foi invadida pelo exército de Hitler que desejava fazer ali um outro Holocausto de muito maiores proporções, escravizar o povo e apropriar-se de suas imensas riquezas. Os russos resistiram, expulsaram os alemães e em 1945 chegaram até Berlin, dando fim a maior guerra de todos os tempos.

O preço foi muito alto para o povo russo: 25 milhões de mortos e um país destruído (sim, quatro vezes mais russos morreram na guerra do que judeus).

No ano passado, nas comemorações dos 70 anos da Vitória, eu estava lá, em Moscou. Pude ver a integração, a admiração e o respeito que o povo tem com o seu exército; o sentido de Pátria e o seu nacionalismo.

Estive na Praça Vermelha, no metrô e na Estação de trem Bieloruskaia, de onde partiram muitos soldados para a guerra.

quinta-feira, 10 de março de 2016

Ivan Turguenev

IVAN TURGUENEV (1818 – 1883)
Julio Pujol


Agrada-me ler Turguenev. Isso é quase uma confissão. Turguenev é fácil. É leve. Lê-lo é como beber um bom copo de água fresca.
            Turguenev é simples. Diferente dos gigantes da literatura russa do século XIX como Tchecov, Dostoiévski e Tolstói, Turguenev não é complexo, profundo, filosófico. Também não é superficial. Penso que está aí o seu mérito. Atingir o simples, e fazê-lo bem, também não é tarefa fácil.
            É como se ele escrevesse para as mocinhas apaixonadas do século XIX, para os salões europeus. Alias, seus escritos parecem não querer tocar no turbilhão transformador da Rússia e da Europa deste século. Um século, diria, de transição, do urbanismo e do capitalismo.
Mas, claro, Turguenev também observa, tem as suas sutilezas. É um homem do tempo. É mundano, moderno, senão seus escritos não teriam atravessado mais de um século, sendo lidos ainda hoje, e sendo colocados como grandes obras da humanidade.
Nascido russo, em Orel, 1818, em uma família de posses, pôde estudar e ter uma vida com certo conforto numa Rússia ainda envolta na servidão (abolida somente em 1861), no analfabetismo e no provincianismo.
Logo que pôde foi para a Europa onde se estabeleceu, e de lá olhava seu país natal com um misto de admiração, nostalgia e desprezo.
Na Alemanha, em Berlim, conviveu com o que de mais avançado havia em seu tempo, seja na literatura quanto na filosofia (particularmente Hegel), e em Baden Baden, conviveu com a “árvore russa”, quer dizer, russos emigrados ou somente em férias, que passavam temporadas neste país. Os russos sempre olharam para a Europa, seja como referência e modelo, seja com superioridade (aquela indiferença típica russa). Isso lhe permitiu manter proximidade com a Pátria nativa.
Contemporâneo dos grandes da literatura russa tinha uma relação também ambígua com eles. De formação europeia, desenraizada da velha Rússia, Turguenev via o seu país de fora; seu espírito crítico e desanimado não era muito simpático na Rússia que buscava afirmar-se como uma grande Nação.
A força da Rússia estava em Tolstói, sua raiz em Puchkin, sua alma em Dostoiévski e Tchecov, sua ironia em Gogol... Mas Turguenev existia. E fez a sua grandeza por outra estrada. Não a estrada dos grandes épicos, do patriotismo exacerbado ou do eslavismo. Os escritos de Tolstói, Tchecov, Puchkin, Dostoiévski, Gogol são universais mesmo partindo da “aldeia” (aliás, aquela frase é de Tolstói); os de Turguenev são cosmopolitas, e olham a Rússia como quem espia para onde vai esse imenso país.
Bom reler Turguenev. Também para mim é como espiar para um jovem (jovial) que também espiava, curioso, de longe, um futuro.
Turguenev corre pelo meu orgânico. Faz parte de minha constituição enquanto ser. Foi emocionante, lá em Petersburgo, dobrar uma esquina e, de surpresa, encontrar uma grandiosa estátua do Conde Turguenev. (lá na Rússia os escritores e poetas tem estátuas e monumentos pelas ruas e praças. E o povo não os depreda; pelo contrário, coloca flores aos seus pés em reconhecimento. É uma coisa de identidade pátria. E Turguenev está lá).
Algumas obras de Turguenev facilmente encontráveis em livrarias no Brasil: “Pais e Filhos”, “Primeiro Amor”, “Ninho de Fidalgos”, “Águas de Primavera”, “Fumaça”, “Mumu”.

É um prazer ler Turguenev.













terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

OS CZARES RUSSOS (II)


                       
Julio Pujol

A Rússia antes da Rússia.

Sendo a Rússia um país milenar e o maior território do planeta é muito difícil traçar uma história linear e que contemple a diversidade de povos espalhados por sua imensidão territorial ao longo do tempo.
Convencionou-se então a abordar a história deste país a partir do sul, da zona das estepes, da região de Kiev, da proximidade com a Europa, do Cáucaso, da Criméia e do Dniepr.
Diz-se que os primeiros povos a habitarem os campos russos foram os citas (da Cítia), no século IV AC, um povo formado por iranianos e chineses, exímios cavaleiros, comerciantes e artesãos que, devido às guerras e dispersões acabaram desaparecendo enquanto povo.
A vasta região então, como caminho do oriente ao ocidente (um dos caminhos da famosa “Rota da Seda” passava pelo que hoje é o sul da Rússia) tornou-se um espaço de passagem, de guerras, de disputas e conquistas entre povos como os Pechenegues, os Kasares, Eslavos, Búlgaros, etc.
No século V, da era cristã, é fundada às margens do rio Dniepr a cidade de Kiev (hoje capital da Ucrânia) que quase quinhentos anos depois se tornaria a primeira capital do que, ainda depois, seria o Estado Russo.
Além de região de ligação entre o oriente (China, Índia) com o Ocidente Europeu, essa região também foi rota Norte-Sul (via rio Dniepr) servindo de passagem aos guerreiros e comerciantes Vikings (suecos, escandinavos) rumo ao rico e desenvolvido Império Bizantino, de capital Bizâncio ou Constantinopla, atual Istambul na Turquia. Esses duas rotas marcaram a constituição inicial da futura Rússia.

                                      (Os Vikings)

Ao norte, próximo a atual São Petersburgo, também se constituíram cidades como Novgorod e Pskov que, assim como Kiev, serviam de entreposto e lugar de abastecimento dos navegantes Nórdicos (Vikings). Eles dominavam o norte europeu e que se deslocavam via o Mar Báltico, o rio Neva e o Dniepr ao sul, até Constantinopla.
Quando em busca de proteção e fortalecimento a cidade de Novgorod busca o príncipe nórdico Riurik em 862 para ser seu governante e em seguida, a partir dele, une-se a Kiev em 882, nasce a primeira Rússia, a chamada “Rus de Kiev” que em poucos séculos se tornará o maior país do mundo.

        (Príncipe Riurik)

Neste período (séculos IX e X) a Rússia deixa a sua pré-história de tribos e clãs, de fronteiras abertas e frágeis e passa a se constituir em um Estado unificado, que busca se consolidar e expandir.
Esse é um período em que também o restante da Europa mergulhava num momento difícil, tentando se recompor do fim do Império Romano. É tempo de Carlos Magno na França e da tentativa de retomada do esplendor da antiga Roma.
A Europa vive o período do Feudalismo e da Idade Média em que o conceito de Estado Nacional não significava muito. Os reinos e principados imperavam, bem como a Igreja Católica buscava se fortalecer e se consolidar em seus mosteiros.

A “Rus de Kiev”:

        A Rus de Kiev nasce com os olhos voltados para o Império Bizantino que, neste período do século IX vivia a sua Renascença. Constantinopla era um grande centro comercial, religioso e cultural, herdeiro das grandes culturas grega e romana da antiguidade. Vale dizer que o Império Bizantino era considerado a “Segunda Roma”. Quando o imperador Teodósio dividiu o império em Império Romano do Ocidente, com sede em Roma, e Império Romano do Oriente, definiu a capital do segundo como Bizâncio.

Com a queda do Império Romano em 476, em função das invasões bárbaras, Bizâncio se torna a única sede do Império que perduraria ainda, a partir daí, por mais mil anos, até 1453.
Na sua consolidação enquanto Estado a Rus vai buscar no Império Bizantino as suas referências. Assim, são enviados sábios a Constantinopla para estudarem e criarem um alfabeto para a Rus. Os bizantinos falavam a língua grega. Dessa maneira nasce o alfabeto Cirílico (dos sábios Cirilo e Metódio) usado até os dias de hoje pelos russos e alguns outros povos.
Ainda nos séculos IX e X a Rus de Kiev e Constantinopla assinam seu primeiro tratado de comércio e relações. E a Rus de Kiev para ser respeitada no cenário internacional procurou se filiar a uma religião reconhecida, superando o paganismo e as crendices. E é nos bizantinos que a Rus busca a sua religião.


O príncipe Vladimir e a conversão da Rússia


No ano 988-89 o príncipe Vladimir, descendente de Riurik, converte-se ao cristianismo ortodoxo de Bizâncio, levando assim toda a “Rus” à conversão. Mas a intenção de Vladimir não era apenas converter-se, e sim incorporar para a “Rus” os avançados aspectos da cultura bizantina. E assim foi feito.
Do que conhecemos da Rússia hoje, das igrejas aos ícones, da arquitetura aos mosaicos, da língua à pintura, é inegável a herança e influência Greco-bizantina.
Os primeiros príncipes Riurik, Oleg, Igor, Sviatoslav, Yaropolk e Vladimir constroem as bases da unidade do Estado Russo que será consolidado por seus descendentes. Neste período, em torno do ano 1000 D.C., ainda não se falava em Rússia e em Czares. Mas os fundamentos da Grande Rússia já estão presentes. Depois disso, preservar e ampliar as fronteiras até a consolidação de um grande império levou ainda mais de 500 anos.
O que tínhamos no ano 1000 eram cidades (talvez não se possa comparar muito com as clássicas cidades-estado gregas) que possuíam autonomia administrativa, eram comandadas por príncipes, tinham territórios mais ou menos definidos, Assembleias Populares (as Veches) para decisões importantes, muralhas de proteção e, como nos romanos, as forças militares ficavam fora dessas muralhas. Essas cidades estabeleciam alianças entre si para se protegerem de invasores.
Também podiam chamar um comandante de fora para lhes governar (e proteger) em períodos de ameaças externas, assim como também os romanos nomeavam um ditador em tempos de guerra.
Para concluir, a Rússia, após este período de conformação inicial, ainda passaria por muitas dificuldades, divisões, guerras, invasões, até que surja o seu primeiro Czar, em torno do ano 1500.
Isso veremos adiante.

                                                    NOVGOROD                                       

                                            






quinta-feira, 28 de janeiro de 2016

OS CZARES RUSSOS (GLI ZAR RUSSI) DE RURIK A ROMANOV (I)

OS CZARES RUSSOS (GLI ZAR RUSSI)
 DE RURIK A ROMANOV  (I)






Julio Pujol

                Para um historiador de formação marxista, saber a história e a cronologia dos governantes (príncipes e czares) pouco ou nada ajudaria na compreensão do processo histórico do imenso país, a Rússia.
Por outro lado, para um leigo (quanto à metodologia histórica) talvez explicasse tudo. Ele se sentiria um conhecedor seguro da história ao saber os nomes , as datas e as particularidades de personalidade (afinal Pedro I era um visionário ou um rústico bruto? Ivan IV era mesmo terrível? Quantos amantes teve Catarina?)
O papel do indivíduo na história é um debate antigo entre os historiadores, particularmente os marxistas. Esse enfrentamento teórico produziu incontáveis textos, livros e teses publicadas por décadas. (Não é propósito aqui seguir adiante).
Resumindo, para o marxismo dialético, o motor da história (que a faz avançar) é a Luta de Classes. E a mesma história evolui segundo os referenciais econômicos, mais precisamente aos “Modos de Produção”, comunismo primitivo, escravismo, feudalismo, capitalismo e por fim, as sociedades inexoravelmente chegariam ao comunismo passando, claro, pela etapa do socialismo.
Como se vê, não há aqui nenhuma referência ao indivíduo; a história andaria por si, por suas próprias leis (científicas). O nó do debate era o seguinte: como explicar então, por exemplo, o papel de Lênin e Napoleão na história?
Confesso que me diverti muito nos anos de Faculdade de História (década de 90) com esse debate. Para mim e para meus colegas era fundamental compreender essas questões, debatê-las e ter uma posição sobre elas. Depois, com a “queda do muro” e o fim da União Soviética tudo mudou. E eu também mudei. A Rússia teve papel fundamental no século vinte, com sua experiência concreta de socialismo, para alimentar, e quiçá, elucidar este debate teórico.
Voltando aos czares russos, é importante sabê-los para compreender também a história deste imenso país que teve ao longo dos séculos um papel determinante na história e na configuração geopolítica do continente europeu e mesmo do mundo.
É preciso lembrar que a Rússia por si só é um continente; é o maior país do mundo e qualquer movimento seu, ou mesmo a sua inércia, tem um impacto planetário. Tem sido assim nos últimos mil anos. Basta lembrar, por exemplo, a conversão dos russos ao cristianismo bizantino (que depois propiciou a Moscou reivindicar o papel de terceira Roma). E mais recentemente, no século XIX, a invasão napoleônica. A derrota de Napoleão, de fato, se deu na Rússia, assim como a derrota de Hitler, no século XX, deu-se também na sua aventura russa.
Por fim, a Revolução Socialista de 1917 condicionou a história do planeta no século XX. Basta lembrar, por exemplo, que em 1922 (apenas cinco anos após a Revolução Russa) se criou no Brasil o Partido Comunista, e até hoje o debate Socialismo X Capitalismo, Estado X Mercado, monopoliza as discussões políticas no país.
Mas voltando novamente aos czares, a Rússia desde seu nascimento teve duas grandes dinastias, os Rijurikovich e os Romanov.
A história do Estado russo inicia quando os moradores da cidade de Novgorod chamam o príncipe Riurik, de uma tribo do Báltico, para governa-los. Logo o poder de Riurik se estende a Kiev (hoje capital da Ucrânia) garantindo a rota fluvial e comercial do Dniepr que unia os povos do Báltico (Vikings) ao Mar Negro e a Bisâncio, então um grande centro cultural e comercial que aproximava a Ásia da Europa. Bisâncio foi a herdeira das grandes culturas grega e romana da antiguidade. Assim nasce a chamada “Rus de Kiev”.
A partir daí, ao longo dos séculos, e sob a condução dos descendentes de Riurik a Rússia se expandiu, principalmente para o leste. Venceu seus inimigos, expulsou invasores (germanos, polacos, suecos, turcos, mongóis, entre outros) e criou novas cidades.
Em busca da segurança do reino (dos principados) a Rússia vai mudando seu eixo de centralidade. Kiev estava muito exposta a invasores e aventureiros. Então o príncipe Vladimir II transfere a capital para uma região mais ao leste, próximo ao rio Moscou e a rota comercial do rio Volga.
Em 1230 o país é invadido e ocupado pelos mongóis (chamados tártaros). Essa ocupação durou mais de duzentos anos e atrasou o desenvolvimento da Rússia. Ao mesmo tempo os principados russos foram se fortalecendo e se unindo em torno do principado de Moscou.
Ivan III assume em 1462 (dando início a primeira dinastia de czares, os Rurikovich) e teve um papel determinante na consolidação da unidade russa, seja por alianças com outros principados, seja por conquista, seja por resistência ao domínio tártaro. É chamado “Gran Príncipe de Moscou e de toda a Rússia” pela primeira vez. É considerado, portanto, o primeiro czar de uma Rússia grande, forte e unificada.
Na continuidade deste texto analisaremos a trajetória de alguns dos mais importantes czares da Rússia (príncipe Vladimir, príncipe Alexandre Névski, Ivan III, Ivan IV, Pedro I, Isabel, Catarina II, Nicoulau, entre outros), e o papel desempenhado por eles na configuração histórico, político, cultural e social deste imenso país.