terça-feira, 1 de julho de 2014

DOSTOIÉVSKI - QUASE UMA BIOGRAFIA

VERÃO EM BADEN-BADEN

     Esperando a próxima Feira do Livro em Porto Alegre terminei a leitura de Verão em Baden Baden de Leonid Tsípkin. (Cia das Letras. SP. 2003), aquisição ainda da última Feira.

   Tsípkin não era escritor de ofício. Era médico, cientista, nascido em 1926 em  Minski. Era judeu. Teve o pai preso em 1934 durante o “Grande Terror”. Duas irmãs e um irmão de seu pai foram mortos também neste período. Isso lhe causou um afastamento das questões da política. Mesmo assim foi também perseguido pelo regime soviético por ser judeu. Nunca conseguiu sair da URSS nem tampouco publicar seus escritos.

     Verão em Baden-Baden foi escrito entre 1977-80, período da crise do Afeganistão e publicado somente em 1982, fora da União Soviética, uma semana antes da morte do autor.

     É um romance histórico que conta a viagem de Dostoiévski e Ana Grigorievna , sua esposa,  à Baden-Baden, na Alemanha, em 1867, onde vão para Dostoiévski jogar no cassino; No percurso o autor vai nos apresentando a história da vida de Dostoiévski e um pouco da sua difícil e contraditória personalidade; Cristão e viciado em jogos, genial escritor humanista que não gostava de judeus; homem carinhoso e agressivo, decidido e dependente.

      Ao mesmo tempo conta a viagem do próprio autor de Moscou a Leningrado para perseguir os passos de Dostoiévski naquela cidade russa onde viveu e escreveu suas grandes obras como “Crime e Castigo” e “Os Irmãos Karamázov”. Passado e presente se misturam, assim como as duas histórias.

     “Verão em Baden-Baden” é um livro difícil, não ruim. Pelo contrário, percebe-se nele o labor cuidadoso do ourives. Lembrou-me um pouco a leitura de “Fogo Pálido” de Nabokov, pela complexidade da narrativa e o paralelismo das histórias. Esse Nabokov, um livro denso, grande e erudito, li-o até o final e não compreendi do que se tratava; e até hoje não compreendo apesar de reconhecer sua grandeza. Mas isso é uma outra resenha.

     “Verão” é um livro tenso, não pelo conteúdo, mas pela forma. Não tem parágrafos nem capítulos. É uma leitura direta, chapada, e as cenas intercalam-se muito rapidamente, sem aviso, exigindo uma atenção de tirar o fôlego.
O roteiro não possui picos, ou seja, é horizontal; você sabe que vai ler o livro até o final e não vai acontecer algo extraordinário. É um acompanhar os passos de Tsípkin, de Dostoiévski e de Ana. E mesmo assim você não consegue parar de ler. Não recomendaria.

     Mas, como eu disse antes, não é ruim, tampouco mal escrito, pelo contrário. É um livro de certa forma para iniciados. Em alguns momentos Dostoiévski te pega pela mão e leva para as mesas de jogos do Cassino, de onde não conseguia sair, noutros te leva a debater com Turgueniev sobre  as peculiaridades da Rússia, ou noutros te apresenta Púshkin. E Tsípikin te puxa pela outra mão e te leva a caminhar pelas ruas de Leningrado, visitando suas belíssimas igrejas, as casas onde Dostoiévski viveu, os caminhos que Raskolnikov percorreu. Te faz recordar o “Grande Terror” stalinista e o cerco de novecentos dias durante a guerra.

     O livro termina quando os caminhos do autor e de Dostoiévski se encontram em São Petersburgo/Leningrado, na casa em que o autor de “O Jogador” morreu, onde “no auge do inverno de Petersburgo dia de verdade não existe – o amanhecer tardio vai imperceptivelmente se convertendo em crepúsculo prematuro”.
     
     
     E Tsípkin se pergunta: “O quê, propriamente, eu vim fazer aqui?”



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